Antropometria aplicada à Avaliação Nutricional.

Para começar, vamos entender os conceitos?

SOBRE A ANTROPOMETRIA APLICADA À AVALIAÇÃO NUTRICIONAL

A nutrição é um dos principais determinantes da saúde, logo, é fundamental avaliar situações de risco nutricional (diagnóstico nutricional) ao planejar ações de promoção da saúde e prevenção de doenças. A composição e a forma do corpo humano variam consideravelmente ao longo da vida em decorrência de inúmeros fatores como crescimento e desenvolvimento, consumo alimentar, prática regular de atividade física e morbidades, entre outros (Ferreira et al., 2018).

A antropometria é o estudo das medidas de tamanhos e proporções corporais humanas. Corresponde a um método duplamente indireto de avaliação nutricional e tem sido apontada como o parâmetro mais utilizado para avaliar o padrão de crescimento e o estado nutricional individual e coletivo, principalmente pela facilidade de obtenção das medidas (prático e menos oneroso) (Gallagher et al., 2013) que podem ser válidas e confiáveis, desde que haja treinamento adequado do avaliador e as aferições sejam devidamente padronizadas (Lee et al., 2014; Brayet al., 2016).

A antropometria nutricional permite identificar se existem, e em que magnitude, desvios pôndero-estruturais e alterações nos compartimentos corporais que possam promover prejuízos para a saúde, sinalizando a possibilidade de intervenções. Assim, a antropometria nutricional é considerada uma importante ferramenta para diagnóstico e acompanhamento do estado nutricional e de saúde em geral de indivíduos e populações por diversos profissionais e pesquisadores da área da saúde e afins (Sampaio, 2012).

No Brasil, além de fazer parte do rol de informações tradicionalmente coletadas para subsidiar diagnósticos e estratégias terapêuticas em âmbito clínico individual, a antropometria é fundamental para alimentar o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN), ferramenta do Ministério da Saúde que tem como objetivos monitorar o estado nutricional dos indivíduos de todas as faixas etárias atendidos em Unidades Básicas do Sistema Único de Saúde, além de nortear a formulação, implementação, avaliação e reorientação de ações governamentais que visem à melhoria das condições de nutrição e saúde da população (Bagni, 2015).

Uso das Medidas Antropométricas

A antropometria tem sido aceita como uma ferramenta importante para fornecer dados prognósticos úteis e uma oportunidade para monitorar os efeitos da progressão de doenças relacionadas à nutrição, bem como de intervenções nutricionais realizadas em nível individual ou coletivo (Bagni, 2015; Ferreira et al., 2018; Sampaio, 2012).

As medidas antropométricas indicam indiretamente a nutrição presente ou passada e podem ser marcadores de problemas de saúde futuros. A antropometria é uma ferramenta simples que pode fornecer aos profissionais de saúde mais informações para desenvolver estratégias de tratamento eficazes e, ao mesmo tempo, reduzir custos com assistência médica (Padilha et al., 2021). Entre as diversas medidas antropométricas, destacam-se as medidas de espessamento de dobras cutâneas, perímetros corporais, diâmetros e comprimentos ósseos, estatura e massa corporal (peso), obtidas por meio de equipamentos especializados.

Essas medidas podem ser interpretadas de forma isolada (ex: dobra cutânea tricipital), incorporadas em equações ou podem ser usadas como indicadores (por exemplo, perímetro da cintura) e índices (ex: índice de massa corporal – IMC) para avaliar risco de desnutrição, excesso de peso ou obesidade, variações na composição corporal (ex: perda de massa muscular, aumento da gordura corporal), problemas relacionados à distribuição do tecido adiposo, e, consequentemente, o risco metabólico para ocorrência de doenças crônicas não transmissíveis, orientando medidas preventivas e intervenções nutricionais (Eaton-Evans, 2013). Ademais, as medidas isoladas também podem ser acompanhadas em longo prazo para avaliar os efeitos das intervenções propostas.

A escolha das medidas antropométricas apropriadas para a avaliação do estado nutricional depende, principalmente, dos objetivos e recursos disponíveis (espaço físico, equipamentos, tempo para avaliação, profissionais de saúde para obtenção das medidas, entre outros), além da faixa etária e das condições clínicas e de saúde do indivíduo, da validade do indicador e da operacionalização (Sampaio, 2012; Eaton-Evans, 2013).

Vantagens e Limitações das Medidas Antropométricas

Em comparação com outros métodos de avaliação do estado nutricional, as medidas antropométricas correspondem à ferramenta mais utilizada na prática clínica e em avaliações epidemiológicas por ser um método prático, de baixo custo, que pode ser realizada com equipamentos portáteis e, especialmente, por detectar alterações nutricionais precoces (Padilha et al., 2021; Sampaio, 2012; Casadei; Kiel, 2020).

Entretanto, esta ferramenta também possui limitações e não deve ser utilizada de forma isolada no diagnóstico nutricional. Os indicadores antropométricos não são específicos, isto é, permitem identificar somente sinais de deficiência ou de excesso do padrão nutricional, e não de um nutriente de forma específica (ex: proteínas e micronutrientes). Da mesma forma não são capazes de identificar pequenas alterações nas proporções de gordura corporal em relação à massa magra e só avaliam a superfície externa do corpo (Eaton-Evans, 2013; Sampaio, 2012).

Outra limitação encontrada na avaliação nutricional antropométrica é a escassez de padrões de referência, especificamente para a população brasileira, sendo comumente utilizados estudos populacionais americanos e europeus (Sampaio, 2012).

Importante salientar que, como qualquer método, ao usar a antropometria para avaliar o estado nutricional é fundamental considerar informações adicionais, como práticas alimentares, resultados de outras avaliações médicas e status socioeconômico para entender melhor o contexto onde o individuo está inserido. Essas informações adicionais fornecem subsídios sobre as causas diretas e subjacentes do estado nutricional do indivíduo, ajudando a estabelecer intervenção nutricional assertiva para recuperação ou manutenção da saúde e da qualidade de vida (Bagni, 2015; Sampaio, 2012).

Erros de Medidas Antropométricas

Todas as medidas antropométricas devem ser feitas com a maior precisão e exatidão possíveis. Erros em medidas antropométricas podem ocasionar distorção da estimativa de desvios nutricionais, favorecendo a perpetuação e agravamento desses desvios. Tanto a super quanto a subestimativa de desvios nutricionais são prejudiciais, podendo resultar em intervenções desnecessárias ou na ausência delas (Eaton-Evans, 2013).

A obtenção das medidas antropométricas deve ser realizada de forma criteriosa com resultados mais fidedignos e robustos para orientar de forma apropriada as ações em saúde pública. A validade do diagnóstico antropométrico depende da seleção correta das medidas a serem aferidas, do treinamento e motivação das equipes, da utilização correta das técnicas de mensuração, que devem ser padronizadas, da escolha da população de referência e dos pontos de corte utilizados para a classificação do estado nutricional.

Nesse contexto, programas periódicos de formação profissional em antropometria são fundamentais para a obtenção de êxito. Tais programas melhoram sobremaneira a qualidade das medidas coletadas e a interpretação correta dos dados antropométricos, favorecendo um diagnóstico nutricional fidedigno. Nos serviços de saúde, essa atividade favorece não somente a identificação e a correção de erros de medidas de antropometristas iniciantes, mas também contribui para manutenção da qualidade das mensurações dos profissionais já capacitados, garantindo uma equipe preparada e comprometida com a oferta de um serviço de qualidade à população (Sampaio, 2012; Bagni, 2015; Madden, 2016).

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Referências

Bagni, U. V.; Barros, D. C. Erro em antropometria aplicada à avaliação nutricional nos serviços de saúde: causas, consequências e métodos de mensuração. Nutrire Rev Soc Bras Aliment Nutr, p. 226-236, 2015.

Casadei, K.; Kiel, J. Anthropometric Measurement. StatPearls. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing Copyright © 2020, StatPearls Publishing LLC.; 2020.

Eaton-Evans J. Nutritional Assessment: Anthropometry. In: Benjamin C, editor. Encyclopedia of Human Nutrition. 3rd ed. Academic Press; 2013. p. 227–32.

Ferreira, A. A.; Barros, D. C.; Bagni, U. V. (Ed.). Avaliação nutricional na atenção básica: reflexões sobre práticas e saberes. SciELO-Editora FIOCRUZ, 2018.

Gallagher, D.; Chung, S.; Akram, M. Body composition. In: B. Caballero, ed. Encyclopedia of Human Nutrition (Third Edition), p. 191-199. Waltham, Academic Press, 2013.

Gibson, R. S. Principles of Nutritional Assessment. New York: Oxford University Press, 2005.

Madden, A. M.; Smith S. Body composition and morphological assessment of nutritional status in adults: a review of anthropometric variables. J Hum Nutr Diet, v. 29, n. 1, p. 7-25, 2016.

Padilla, C. J.; Ferreyro, F. A.; Arnold, W. D. Anthropometry as a readily accessible health assessment of older adults. Exp Gerontol, 2021.

Sampaio, L. R. Avaliação nutricional. EDUFBA, 2012. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/16873/1/avaliacao-nutricional.pdf

Tur, J. A.; Bibiloni, M. D. M. Anthropometry, Body Composition and Resting Energy Expenditure in Human.Nutrients, v. 11, n. 8, p. 1891, 2019.