Métodos de Avaliação da Composição Corporal.

A avaliação nutricional é uma importante ferramenta para determinar a presença de fatores, condições ou diagnósticos que possam afetar o estado nutricional do indivíduo. Por meio da análise da composição corporal é possível estimar os compartimentos corporais (massa de gordura e massa corporal magra), que podem fornecer informações importantes sobre a eficácia de intervenções clínicas, relacionadas à prática de atividade física e nutricionais.

Métodos de avaliação da composição corporal

Os métodos de avaliação da composição corporal são divididos em três grupos: direto, indiretos e duplamente indiretos.

  1. O método direto, apesar de apresentar elevada precisão, tem utilidade limitada, pois a análise é realizada por dissecação física ou físico-química de cadáveres.
  2. Os métodos indiretos são procedimentos laboratoriais que oferecem estimativas muito precisas sobre os componentes da composição corporal (Ex: pesagem hidrostática, plestimografia, absorciometria de raio-x de dupla energia – DXA, tomografia computadorizada – TC e ressonância magnética – RM). Esses métodos são utilizados principalmente para validar as técnicas duplamente indiretas.
  3. Os métodos duplamente indiretos são baseados nas medidas antropométricas (perímetros corporais e dobras cutâneas) e na bioimpedância elétrica (BIA). São classificados como “métodos duplamente indiretos”, pois resultam de equações ou normogramas derivados dos métodos indiretos. Estas equações normalmente são formuladas para populações muito específicas, como atletas, não-atletas, jovens, idosos, crianças, homens, mulheres, negros, brancos e asiáticos, etc.

Os princípios básicos de obtenção da composição corporal são distintos entre os métodos. Abaixo alguns exemplos:

BIA → Este método se baseia na condução de uma corrente elétrica de baixa intensidade através      do corpo, e  posterior  registro  da  condutibilidade  e  da  resistência  promovida  pelos  diversos   tecidos corporais ao fluxo da corrente elétrica. Os tecidos que contêm pouca água e eletrólitos, tais como tecido adiposo e o tecido ósseo, são  maus  condutores  da  corrente  eléctrica,  oferecendo grande oposição à passagem da mesma. Tecidos biológicos como o sangue, as vísceras e os músculos são bons condutores devido aos elevados conteúdos em fluidos e eletrólitos. A impedância é uma combinação  de  dois componentes: Resistência (oposição da massa corporal extracelular) e  Reactância (oposição adicional das membranas celulares ou massa corporal intracelular). Baseado nessas diferenças de condutividade, equações são utilizadas para estimar a composição corporal.

DXA → Esse método é baseado na atenuação de raios em diferentes níveis de energia e permite realizar a mensuração corporal total e por segmentos (cabeça, tronco e membros). O princípio básico da absorciometria é o “escaneamento” com a utilização de uma fonte de raio-x com um filtro que converte um feixe de raio-x em picos fotoelétricos de baixa e alta energia que atravessam o corpo do indivíduo. Após passar pelo corpo, os raios X atenuados são medidos por um detector discriminante de energia. A atenuação diferenciada dos feixes de fótons nos tecidos orgânicos permite a construção de imagens daárea de interesse, e, após tratamento matemático das informações, torna-se possível estabelecer estimativas quanto à densidade e ao conteúdo mineral ósseo, ao componente de gordura corporal e à massa isenta de gordura dos tecidos não-gordurosos.

TC → Esse método é baseado na relação entre o grau de atenuação de um feixe de raio-x e a densidade dos tecidos através dos quais o feixe passou. Desta relação, uma imagem a duas dimensões da anatomia interior da área analisada pode ser construída.

RM → Por esse método, uma imagem dos tecidos do corpo é gerada por radiação eletromagnética,sob influxo de forte campo magnético que excita o núcleo dos átomos de hidrogênio das moléculas de água e de lipídios. O núcleo emite sinais que, captados pelo computador, são tratados e transformados em imagens, permitindo assim diferenciar os tecidos moles (gordura e músculo) das estruturas ósseas.Algumas vantagens e desvantagens em relação a cada método de avaliação da composição corporal.

Algumas vantagens e desvantagens em relação a cada método de avaliação da composição corporal

Bioimpedância Elétrica (BIA)

Dentre os métodos utilizados para a avaliação da composição corporal, a BIA tem sido amplamente utilizada, devido à forte correlação com métodos considerados padrão ouro e à maior acessibilidade comparada a outros métodos mais complexos. Entretanto, uma das maiores limitações desse método é a grande sensibilidade em relação ao estado hídrico do avaliado, à ingestão de alimentos e à realização de atividade física antes do exame, sendo necessários protocolos pré-testes muito rígidos.

Atualmente existe uma variedade de aparelhos de BIA no mercado, contudo, é necessária a condução de pesquisas com o objetivo de testar os diferentes modelos comercializados e a especificidade de suas equações preditivas para diferentes populações, a fim de obter evidências sobre validade, precisão e confiabilidade dos resultados obtidos. A seguir serão apresentados alguns artigos sobre comparação de diferentes modelos portáteis de análise de BIA com outros equipamentos mais precisos e/ou padrão ouro com objetivo de discutir a validade e confiabilidade desses equipamentos para a prática clínica.

Em estudo realizado em adultos, a BIA (Tanita®, modelo UM 014, pé a pé) superestimou o percentual de gordura corporal em homens e subestimou o percentual de gordura corporal em mulheres, em comparação com DXA (LAMB et al., 2014). Quando comparado os resultados da BIA (Tanita®, modelo BC 305, tetrapolar e frequência simples de 50 kHz) com a TC, foi observada correlação positiva para predição da gordura visceral, contudo, a precisão da BIA foi limitada, especialmente entre os indivíduos com excesso de peso (IMC ≥ 25,0) (LU et al., 2017). Outro estudo realizado com adultos e idosos, concluiu que a BIA (Biodynamics®, modelo 310, tetrapolar) apresentou satisfatória sensibilidade e especificidade para predizer gordura visceral nos dois grupos etários, quando comparada aos dados obtidos pela TC (EICKEMBERG et al., 2013).

Em um estudo com atletas (jogadores de basquete), foi observado que não houve boas correlações entre DXA e as avaliações da composição corporal usando dois equipamentos de BIA (Omron®, modelo 306C, mão a mão e frequência simples de 50 kHz; Tanita®, modelo 521, pé a pé e frequência simples de 50 kHz) e dobras cutâneas. No entanto, a BIA modelo pé a pé apresentou melhor padrão para estimativa do percentual de gordura corporal em comparação ao DXA do que os outros métodos. A correlação com o DXA foi menor para as dobras cutâneas do que para os equipamentos de BIA (PLOUDRE et al., 2018).

Estudo realizado com adolescentes, comparou quatro equipamentos de BIA (BIA 1- Biodynamics®, modelo 450, tetrapolar; BIA 2 – Tanita®, modelo BC-558, tetrapolar; BIA 3 – Biospace InBody®, modelo 230, tetrapolar equipada com oito eletrodos táteis e BIA 4 – Tanita®, modelo 2220, bipolar) com DXA para predição do percentual de gordura corporal. Foi observado que a BIA 3 apresentou resultados mais próximos ao DXA, apresentando, também, maior concordância, enquanto a BIA 2 apresentou os piores resultados. De forma geral, os equipamentos de BIA apresentaram boa capacidade preditiva para estimar o excesso de gordura corporal em adolescentes (GONÇALVES et al., 2013).

Outro estudo realizado com BIA (Omron®, modelo BF 306W, multifrequência, tetrapolar) em indivíduos com sobrepeso, não observou boa correlação entre a BIA e o DXA para predição da gordura corporal. Os resultados da BIA subestimaram o percentual de gordura, contudo, este método demonstrou ser mais eficaz para mensurar alterações no percentual de gordura e na massa de gordura (kg) durante um programa de perda de peso em indivíduos com sobrepeso em comparação ao método de dobras cutâneas (BENITO et al., 2019).

De acordo com os artigos discutidos, foi possível observar a utilização de diversos modelos de BIA, com diferentes resultados entre eles. Nesse sentido, a variação entre os resultados dos estudos pode ser em virtude das diferenças na faixa etária, gênero, tipo de equipamento e protocolo de preparo utilizado. No geral, os estudos concluíram que a BIA é um método válido para avaliação da composição corporal, contudo, seus resultados oscilam de acordo com as especificidades técnicas dos aparelhos.

Os dispositivos bipolares são os mais comuns e analisam a impedância dos segmentos corporais inferiores (pé a pé) ou superiores (mão a mão). Esses instrumentos bipolares geralmente são considerados menos precisos do que modelos com mais eletrodos (tetrapolares ou octopolares) que medem a impedância em todo o corpo. Vale ressaltar também que os modelos mais simples não oferecem os resultados brutos do exame (Resistência e Reactância), fornecendo diretamente os valores de percentual de gordura corporal e massa corporal magra (que são calculados por equações do equipamento muitas vezes desconhecidas), não sendo possível a utilização desses dados em equações para avaliação de populações específicas (ex. obesos, atletas, adolescentes, etc).

Dessa forma, apesar da BIA parecer superestimar ou subestimar valores quando comparada a outros métodos mais precisos, pode ser considerada um método alternativo por ser relativamente simples e prática, não invasiva e mais acessível quando comparada aos equipamentos padrão ouro, podendo ser utilizada na prática clínica e em estudos clínicos ou epidemiológicos para a avaliação da composição corporal.

Referências

Hsueh-Kuan L, Yu-Yawn C, Chinagwen Y, et al. Discrepancies between leg-to-leg bioelectrical Impedance analysis and computerized tomography in abdominal visceral fat measurement. Sci Rep, 7(1), p.1-8, 2017.

Benito PJ, Candela CG, Cabañas MD, Szendrei B, Castro EA. Comparison between different methods for measuring body fat after a weight loss program. Rev Bras Med Esporte, 25(6), p. 474-479, 2019.

Ploudre A, Arabas JL, Jorn L, Mayhew JL. Comparison of techniques for tracking body composition changes across a season in college women basketball players. Int J Exerc Sci, 11(4), p. 425-438, 2018.

Gonçalves VS, Faria ER, Franceschini SC, Priore SE. Capacidade preditiva de diferentes equipamentos de bioimpedância elétrica, com e sem preparo prévio, na avaliação de adolescentes. J. Pediatr, 89(6), p. 567- 574, 2013.

Eickemberg C, Oliveira CC; Roriz AK, Fontes GA, Mello AL, Sampaio LR. Bioelectrical impedance and visceral fat: a comparison with computed tomography in adults and elderly. Arq Bras Endocrinol Metab, 57(1), p. 27-32, 2013.

Lamb MJE, Byrne CD, Wilson JF, Wild SH. Evaluation of bioelectrical impedance analysis for identifying overweight individuals at increased cardiometabolic risk: a cross-sectional study. PLoS One, 9(9), p. e106134, 2014.